Sonhando
(2a. edição agora em versos alexandrinos, de 1973)
Neste momento, amor, neste exato momento,
Em que a treva, afinal, deixou meu coração,
E que o silêncio é como um santo sacramento
Que o envolveu numa doce e plácida oração;
E meu olhar fitando ansioso e mais atento
Este instante de louca e ébria exaltação,
Gostaria de ter um grande sortimento
De dias de calor mais longos do que são...
Nunca sinto o teu vulto amado tão presente,
Como quando percebo, em ânsias, que, realmente
És um sonho, és um fruto, uma doce ilusão!...
E muito mais feliz então me sinto quando
Tenho a certeza que acordado estou sonhando,
E este sonho faz bem para o meu coração.
30.08.1994
O passado
Nada mata o passado e nem a própria morte
Sorrateira e fatal, um dia, há de matá-lo,
Pois ele ataca como o ataque de um cavalo
Que coice distribui a toda e qualquer sorte.
O passado inexiste e é real – causa abalo
No coração e após, espúrio na alma, corte
Que o peito faz sangrar de um mendigo ou de um forte,
E invisível machuca e fere como um calo.
O passado é vingança a existir no futuro:
É cicatriz que sangra invisível na pele
É a atroz resignação que se vive calada.
É o murro que se dá de raiva, contra o muro,
É o pus que na agonia a nossa boca expele,
É a insônia que acontece em longa madrugada.
25.02.1995
Campanha da Fraternidade/1995
Eras tu, meu Senhor? Mas como eu poderia
Imaginar que aquele idiota, olhar de fera,
Arma nas duas mãos, com uivos de pantera
Era o Senhor testando a minha teimosia?
Impedia-me a fala e gritava. E grunhia,
Pegou minha carteira e de maneira austera
Disse que era ladrão, que tinha fome, que era
Resto de estercorácia a viver sem valia.
Eras tu, meu Senhor, eu devia sabê-lo
Assim não passaria horas de pesadelo,
Nem temeria, não, contigo, esse arcabuz.
Mas pensei se ladrão e tomei minha arma,
E bastou seu cochilo – atirei sem alarma...
– No chão tombou deixando uma sombra de cruz!
11.03.1995
Bepe
(José Micheletti)
Bepe aprendeu, um dia, a debulhar o trigo,
E o milagre aprendeu de fabricar o pão.
E como o bom Pastor, de todos, foi amigo,
E mais que amigo, foi de cada ser – Irmão!
Bepe fez de seu Lar o mais sincero abrigo
E a Família reuniu numa terna oração.
Não deixando, jamais, que um infausto perigo
Viesse destruir do amor – qualquer lição.
Hoje Bepe entre nós, é uma imensa saudade,
E aquele olhar de paz, de ternura e amizade,
Com certeza a cumprir está outra missão:
Pelos campos do céu, é lavrador amado,
Semeia a paz e o amor nesse solo sagrado,
E colhe o trigo bom para fazer o pão.
34.04.1995
Cismas
Fulge em sonhos a noite... a noite fulge em sonhos,
Amplos vales azuis, pássaros mil em bando,
Desencontros fatais e retornos tristonhos
"Ela não veio, mas virá por certo... quando?"
Não sei. Não sei dizer. Pesadelos medonhos...
"Amanhã vou falar-lhe. Estará me esperando?"
"Não fui porque não quis..." E nos lábios risonhos
Sorrisos de desdém... Mas por que estou chorando?
Ardem astros no céu, em febre também ardo.
"Vou tentar esquecer as angústias e os medos..."
Os sonhos vão-se além, e meu viver é tardo.
Além fulgura o sol em majestosas luzes.
E eu preso em mim estou com cismas e segredos,
Preso num pesadelo estirado entre cruzes!
13.05.1995
Portinari em exposição
Certa vez Portinari, em uma exposição,
(Onde de si fazia uma retrospectiva),
Mostrando com prazer a toda a multidão
Telas de toda a vida inspirada e ativa,
Elogios ouvia e com satisfação
Sorria aos parabéns de maneira cativa.
Até que alguém falou de um quadro do salão
E a face do Pintor ficou de luz mais viva!...
–“Mestre, por que o Senhor junto às telas abstratas,
Onde em cores compões naturezas e matas
Colocas esta tela acadêmica, fria?!..."
–“Eu pinto estes borrões pois faz parte do show,
Mas aquela Mulher retratada em poesia,
Aquela é minha Mãe!"
e depois silenciou...
01.06.1995
Meninos abandonados
Oh! meninos que andais vagando pela rua
Perguntando ao “doutor” se ele tem uns trocados...
Maltrapilhos vós sois, por todos, enxotados,
Tal qual os animais que ladram para a lua.
Em vós percebo, triste, uma alma rota nua
Vós somente quereis ser pelo mundo amado.
Porém, para o “doutor” pareceis desgraçados,
Quando um de vós humilde, ou órfão, se insinua.
Vejo, triste, na noite, uma criança pobre,
Com o frio cortante a penetrar-lhe a alma
E um coberto sequer este molambo cobre.
Porém, mal nasce o sol da gravidez do dia,
Novamente pedis com humildade e calma,
Para o mesmo “doutor”, trocados de alegria...
02.06.1995
Nossa Senhora agredida
Um homem – um ateu, hipócrita em excesso,
Quis a todos mostrar – com seu gesto cretino,
Que somente chutava uma imagem de gesso
E ela não lhe podia alterar-lhe o destino.
E a imagem agrediu... e entre os seus fez sucesso;
A agredida, porém, com seu olhar divino
Nas contas não levou todo aquele arremesso
E calada assistiu o ataque ressupino.
O homem, porém, não quis profanar tal imagem
(Que é gesso, tão-somente) ele quis mais pois quer
Não sei porquê, mostrar que Maria é miragem...
Mas foi Ela que um dia, em todo o seu receio,
Ao seu filho Jesus foi Mãe e foi Mulher
Dando ao pequeno Deus o leite de seu seio.
03.11.1995
Para Maria Cecília
Eu quero dedicar este Soneto à Amiga
Que nunca dedicou o teu tempo à riqueza;
Mas antes, se enfronhou na paz da Natureza,
– Sublime Atar de Deus que a Inspiração abriga!
Verdes mares de luz! Esta mensagem presa
Explode o coração que alerta diz – prossiga!
Pois a Poesia deve atrelar-se a esta viga
Que sustenta o Poeta em sua única reza.
O Poeta vê Deus! E Seu amor entende –
Em elos de ouro prende a rima fugidia
E com etérea luz nos mostra um sonho oculto.
E a Alma gêmea este Amor infinito compreende:
Vislumbra a Inspiração, rima nova Poesia,
Ergue um Altar a Deus e em prece faz seu culto!
13.11.1995
Pecado mortal
O pecado maior que pode haver na terra
É deturpar o amor com falsos moralismos...
O desejo enterrar em profundos abismos
E erguer dogmas de fé em trincheiras de guerra!
Deus em Seu dom maior que plenitude encerra
Ao homem deu o amor em fontes de batismos,
Mas os cegos, porém, em vis egocentrismos
Teimam toldar o amor que exulta, esplende, berra!
O amor em tudo vibra e os corações aquece;
Quem tem no coração o amor, quem na alma sente
O desejo de amar, tem nos lábios a prece
De dividir o amor com a pessoa amada,
Aventuras viver com a alma apaixonada,
E acreditar no amor e dele viver crente
28.02.1996
Funestas fantasias
Depois que te perdi procurei noutros passos
Meu futuro encontrar: no acumular dos dias
Tão-somente encontrei funestas fantasias,
Fatais desilusões, tropeços e fracassos...
Até tentei achar carinhos n’outros braços,
Numa pobre ilusão e falsas alegrias...
Que hoje somente tenho em minhas romarias
De tão sonhado amor, derrotas e cansaços...
Por isso, Amada, volto e peço novamente
Que coloques comigo os passos nesta vida
Pois da Árvore do Amor nós temos a semente.
É contigo que sonho a minha realidade,
Quero contigo ter minha felicidade,
Quero contigo ter a esperança querida!
07.05.1996
Soneto de um passado
Quando em silêncio estava a compor meus poemas
A Bem-amada em casa andava em pés de plumas,
Para que o Seu Poeta os versos em diademas
Domasse a Musa e a rima em cantigas de espumas...
Algumas vezes ela ofertava-me os temas
E exigia de mim bons poemas... algumas
Vezes eu lhe ofertava os versos como gemas
E ela dizia a rir: com versos me perfumas!...
Mas eu um dia, triste, abandonei as rimas,
E dos meus versos ela esqueceu os aromas
E fomos nós viver em diferentes climas...
Separados então vivemos nossos dramas,
Os seus sonhos de amor ela pôs em redomas,
E eu não mais me esqueci do seu amor – as chamas!
07.05.1996
(2a. edição agora em versos alexandrinos, de 1973)
Neste momento, amor, neste exato momento,
Em que a treva, afinal, deixou meu coração,
E que o silêncio é como um santo sacramento
Que o envolveu numa doce e plácida oração;
E meu olhar fitando ansioso e mais atento
Este instante de louca e ébria exaltação,
Gostaria de ter um grande sortimento
De dias de calor mais longos do que são...
Nunca sinto o teu vulto amado tão presente,
Como quando percebo, em ânsias, que, realmente
És um sonho, és um fruto, uma doce ilusão!...
E muito mais feliz então me sinto quando
Tenho a certeza que acordado estou sonhando,
E este sonho faz bem para o meu coração.
30.08.1994
O passado
Nada mata o passado e nem a própria morte
Sorrateira e fatal, um dia, há de matá-lo,
Pois ele ataca como o ataque de um cavalo
Que coice distribui a toda e qualquer sorte.
O passado inexiste e é real – causa abalo
No coração e após, espúrio na alma, corte
Que o peito faz sangrar de um mendigo ou de um forte,
E invisível machuca e fere como um calo.
O passado é vingança a existir no futuro:
É cicatriz que sangra invisível na pele
É a atroz resignação que se vive calada.
É o murro que se dá de raiva, contra o muro,
É o pus que na agonia a nossa boca expele,
É a insônia que acontece em longa madrugada.
25.02.1995
Campanha da Fraternidade/1995
Eras tu, meu Senhor? Mas como eu poderia
Imaginar que aquele idiota, olhar de fera,
Arma nas duas mãos, com uivos de pantera
Era o Senhor testando a minha teimosia?
Impedia-me a fala e gritava. E grunhia,
Pegou minha carteira e de maneira austera
Disse que era ladrão, que tinha fome, que era
Resto de estercorácia a viver sem valia.
Eras tu, meu Senhor, eu devia sabê-lo
Assim não passaria horas de pesadelo,
Nem temeria, não, contigo, esse arcabuz.
Mas pensei se ladrão e tomei minha arma,
E bastou seu cochilo – atirei sem alarma...
– No chão tombou deixando uma sombra de cruz!
11.03.1995
Bepe
(José Micheletti)
Bepe aprendeu, um dia, a debulhar o trigo,
E o milagre aprendeu de fabricar o pão.
E como o bom Pastor, de todos, foi amigo,
E mais que amigo, foi de cada ser – Irmão!
Bepe fez de seu Lar o mais sincero abrigo
E a Família reuniu numa terna oração.
Não deixando, jamais, que um infausto perigo
Viesse destruir do amor – qualquer lição.
Hoje Bepe entre nós, é uma imensa saudade,
E aquele olhar de paz, de ternura e amizade,
Com certeza a cumprir está outra missão:
Pelos campos do céu, é lavrador amado,
Semeia a paz e o amor nesse solo sagrado,
E colhe o trigo bom para fazer o pão.
34.04.1995
Cismas
Fulge em sonhos a noite... a noite fulge em sonhos,
Amplos vales azuis, pássaros mil em bando,
Desencontros fatais e retornos tristonhos
"Ela não veio, mas virá por certo... quando?"
Não sei. Não sei dizer. Pesadelos medonhos...
"Amanhã vou falar-lhe. Estará me esperando?"
"Não fui porque não quis..." E nos lábios risonhos
Sorrisos de desdém... Mas por que estou chorando?
Ardem astros no céu, em febre também ardo.
"Vou tentar esquecer as angústias e os medos..."
Os sonhos vão-se além, e meu viver é tardo.
Além fulgura o sol em majestosas luzes.
E eu preso em mim estou com cismas e segredos,
Preso num pesadelo estirado entre cruzes!
13.05.1995
Portinari em exposição
Certa vez Portinari, em uma exposição,
(Onde de si fazia uma retrospectiva),
Mostrando com prazer a toda a multidão
Telas de toda a vida inspirada e ativa,
Elogios ouvia e com satisfação
Sorria aos parabéns de maneira cativa.
Até que alguém falou de um quadro do salão
E a face do Pintor ficou de luz mais viva!...
–“Mestre, por que o Senhor junto às telas abstratas,
Onde em cores compões naturezas e matas
Colocas esta tela acadêmica, fria?!..."
–“Eu pinto estes borrões pois faz parte do show,
Mas aquela Mulher retratada em poesia,
Aquela é minha Mãe!"
e depois silenciou...
01.06.1995
Meninos abandonados
Oh! meninos que andais vagando pela rua
Perguntando ao “doutor” se ele tem uns trocados...
Maltrapilhos vós sois, por todos, enxotados,
Tal qual os animais que ladram para a lua.
Em vós percebo, triste, uma alma rota nua
Vós somente quereis ser pelo mundo amado.
Porém, para o “doutor” pareceis desgraçados,
Quando um de vós humilde, ou órfão, se insinua.
Vejo, triste, na noite, uma criança pobre,
Com o frio cortante a penetrar-lhe a alma
E um coberto sequer este molambo cobre.
Porém, mal nasce o sol da gravidez do dia,
Novamente pedis com humildade e calma,
Para o mesmo “doutor”, trocados de alegria...
02.06.1995
Nossa Senhora agredida
Um homem – um ateu, hipócrita em excesso,
Quis a todos mostrar – com seu gesto cretino,
Que somente chutava uma imagem de gesso
E ela não lhe podia alterar-lhe o destino.
E a imagem agrediu... e entre os seus fez sucesso;
A agredida, porém, com seu olhar divino
Nas contas não levou todo aquele arremesso
E calada assistiu o ataque ressupino.
O homem, porém, não quis profanar tal imagem
(Que é gesso, tão-somente) ele quis mais pois quer
Não sei porquê, mostrar que Maria é miragem...
Mas foi Ela que um dia, em todo o seu receio,
Ao seu filho Jesus foi Mãe e foi Mulher
Dando ao pequeno Deus o leite de seu seio.
03.11.1995
Para Maria Cecília
Eu quero dedicar este Soneto à Amiga
Que nunca dedicou o teu tempo à riqueza;
Mas antes, se enfronhou na paz da Natureza,
– Sublime Atar de Deus que a Inspiração abriga!
Verdes mares de luz! Esta mensagem presa
Explode o coração que alerta diz – prossiga!
Pois a Poesia deve atrelar-se a esta viga
Que sustenta o Poeta em sua única reza.
O Poeta vê Deus! E Seu amor entende –
Em elos de ouro prende a rima fugidia
E com etérea luz nos mostra um sonho oculto.
E a Alma gêmea este Amor infinito compreende:
Vislumbra a Inspiração, rima nova Poesia,
Ergue um Altar a Deus e em prece faz seu culto!
13.11.1995
Pecado mortal
O pecado maior que pode haver na terra
É deturpar o amor com falsos moralismos...
O desejo enterrar em profundos abismos
E erguer dogmas de fé em trincheiras de guerra!
Deus em Seu dom maior que plenitude encerra
Ao homem deu o amor em fontes de batismos,
Mas os cegos, porém, em vis egocentrismos
Teimam toldar o amor que exulta, esplende, berra!
O amor em tudo vibra e os corações aquece;
Quem tem no coração o amor, quem na alma sente
O desejo de amar, tem nos lábios a prece
De dividir o amor com a pessoa amada,
Aventuras viver com a alma apaixonada,
E acreditar no amor e dele viver crente
28.02.1996
Funestas fantasias
Depois que te perdi procurei noutros passos
Meu futuro encontrar: no acumular dos dias
Tão-somente encontrei funestas fantasias,
Fatais desilusões, tropeços e fracassos...
Até tentei achar carinhos n’outros braços,
Numa pobre ilusão e falsas alegrias...
Que hoje somente tenho em minhas romarias
De tão sonhado amor, derrotas e cansaços...
Por isso, Amada, volto e peço novamente
Que coloques comigo os passos nesta vida
Pois da Árvore do Amor nós temos a semente.
É contigo que sonho a minha realidade,
Quero contigo ter minha felicidade,
Quero contigo ter a esperança querida!
07.05.1996
Soneto de um passado
Quando em silêncio estava a compor meus poemas
A Bem-amada em casa andava em pés de plumas,
Para que o Seu Poeta os versos em diademas
Domasse a Musa e a rima em cantigas de espumas...
Algumas vezes ela ofertava-me os temas
E exigia de mim bons poemas... algumas
Vezes eu lhe ofertava os versos como gemas
E ela dizia a rir: com versos me perfumas!...
Mas eu um dia, triste, abandonei as rimas,
E dos meus versos ela esqueceu os aromas
E fomos nós viver em diferentes climas...
Separados então vivemos nossos dramas,
Os seus sonhos de amor ela pôs em redomas,
E eu não mais me esqueci do seu amor – as chamas!
07.05.1996
Ésio Antonio Pezzato
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